Este foi um dos livros que trouxe da feira do livro de Lisboa e que não podia ser mais actual (quando é que vai deixar de ser actual?). A edição lindíssima é da Antígona. O autor tem sido uma voz activa pela causa palestiniana e escreveu este livro de poemas como homenagem à avó – Rifqa – que é uma sobrevivente do Nakba (quando, em 1948, 68% do território palestiniano foi ocupado por Israel e foi declarada a independência do estado de Israel).
Assim, os poemas percorrem a história desta família que é, no fundo, a história de um povo.
Deixo aqui alguns dos poemas que mais me marcaram:
Sobre bombas:
«Fogos-de-artifício ou bombas?»
pergunta Loren. Um tornado de risos
escapa-nos das bocas
atingidas pelo nosso torpor
de maneiras fatais.
A minha mãe sempre disse:
«Os desastres mais trágicos
são os que fazem rir.»
Sobre nascer e morrer:
O nascimento dura mais que a morte.
Na Palestina a morte é súbita,
instantânea
incessante,
acontece entre dois fôlegos.
Sobre uma mulher em trabalho de parto:
O soldado diz-lhe que a hipótese de uma ambulância
é nula, a passagem exige uma autorização.
As mulheres, cheias de fúria e trémulas,
dizem-lhe para fazer força.
Ela dá à luz uma ameaça à segurança;
a primeira coisa que vê é o buraco de uma bala.
Sobre a ocupação:
Um soldado tão velho como uma folha nascida ontem
puxa o gatilho contra uma mulher mais velha do que
a herança dele.
Aqui, cada passo é um túmulo,
cada avó é uma Jerusalém.
Sobre casa:
Os colonizadores juvenis com roupas diferentes
espingardas a baterem-lhes nas ancas nação terrorista
celebraram a propriedade roubada insensíveis
Chorei – não pela casa
mas pelas memórias que podia ter tido dentro dela.
Sobre a irmã:
Maha a irmã de três anos chorava a sua inocência,
viu os colonos sionistas queimarem-lhe a cama,
(…) Maha tem agora oito.
sabe que não é a única criança cuja cama foi queimada,
sabe que as crianças são queimadas.
Sobre Nakba:
É o mesmo massacre
em todo o lado.
Setenta e tal anos depois.
nem um dia vivemos.
Sobre Deus:
Os invasores voltaram uma vez mais,
reclamaram a terra
com força e fogo desculpas crenças
dos eleitos e dos prometidos
como se Deus fosse um agente imobiliário.
Tenho vontade de deixar aqui todos os poemas, porque este livro precisa muito de ser lido. Não o podia recomendar mais. Leiam. Aliás, comprem (porque a Antígona merece todo o apoio por esta edição) e leiam.
Fonte: Mar de Maio